João Gil esgotou, esta quarta-feira, a lotação do grande Auditório da Culturgest. Uma boa parte não terá de vida os anos que o músico tem de carreira. Mas as canções estavam todas na ponta da língua e muitas delas, foram, nesta noite, entregues ao público que as devolveu com gratidão.
A Culturgest está a abrir portas a um novo público, com a proposta de um ciclo de concertos. João Gil foi o primeiro a entrar e perante uma plateia mais habituada a criações contemporâneas, deixou o aviso: “Isto hoje vai ser para despentear…”. E a verdade é que conseguiu agitar os presentes e fazer ouvir as vozes, de início contidas, de quem assistia.
O alinhamento trazia alguns convidados já anunciados, que ajudaram a promover o ambiente de festa. Amigos que o ajudaram a cantar as suas músicas, de projetos em que esteve envolvido ou que ajudou a fundar, como os Trovante, Ala dos Namorados ou Rio Grande. Proporcionou assim, ao longo da noite, a oportunidade de revisitar temas que fazem parte da história da música portuguesa, com novos arranjos.
Paula Pires (Paulinha, como João Gil carinhosamente a prefere tratar) foi a primeira a pegar no microfone e a fazer-nos recordar “Xácara das Bruxas Dançando”. Seguiu-se Tatanka, o músico dos Black Mamba, a colar a sua soul a temas como “Fim do Mundo”, “Saudade” ou “Deixa-te ficar na minha casa”. O público deixa-se levar, principalmente pela versão mais quente de “Saudade”.
Nuno Guerreiro e Manuel Paulo são os convidados seguintes. Começam com uma versão muito groove de “Solta-se um Beijo” e transitam, quase sem interrupção para “Loucos de Lisboa”, com um cenário a condizer. Um elétrico amarelo é projetado na tela ao fundo e o público já não está a sussurrar os temas, mas a cantar em plena voz, a meias com a Ala dos Namorados. As luzes baixam de seguida, e o momento recupera a solenidade habitual da sala para “Perdidamente”. João Gil partilha o banco do piano com Manuel Paulo. Os versos de Florbela Espanca soam intensos e espalham-se pelas almas presentes. E como é que se sai desta tensão emocional? João Gil vira o disco para “História do Zé Passarinho” e o ambiente mais popular da noite instala-se no palco. Já se começa a sentir o corpo inquieto, com vontade de dançar.
O convidado seguinte chega com emoção. Pai e filho em palco, juntam guitarras e mostram uma bonita relação, também musical. Rafael e João Gil ficam sozinhos em palco e deram-nos “Senta-te aí”, “Ao Sul” (que já haviam tocado juntos no Campo Pequeno) e “Cheiro dos Livros”. Este ultimo tema, escrito por Carlos Tê, é apresentado por João Gil com uma reflexão sobre a importância de termos bons professores, que marquem a diferença.
A noite volta a ser de festa animada com a entrada de Tim. Vestido de preto, como é habitual, de lenço vermelho ao pescoço, e o à vontade de quem já pisou mais palcos do que passeios, vai trocando olhares com o anfitrião. A cumplicidade dos músicos chega à plateia que já conseguiu tirar algumas pessoas das cadeiras para dançar.
Quase a chegar ao final do concerto, João Gil agradece o convite para a iniciativa e de luzes acesas, também a presença da Ministra da Cultura, Graça Gonçalves.
Carlão, é o último convidado a juntar-se aos músicos em palco e quase conseguiu o inédito: por a Culturgest aos saltos! Conseguiu, sem dúvida, deixar a plateia a vibrar com “125 Azul”.
Já em encore, João Gil anunciou outra surpresa. Pedro Vidal, produtor musical e habitualmente escudado pela guitarra, faz ouvir a sua voz ao microfone em “Nina”, um tema que tem letra de Miguel Araújo.
Depois de “Timor” a despedida faz-se com todos os convidados em palco a cantar “Loucos de Lisboa”. Foi uma noite de viagem ao passado, transformada em algo bem atual e presente, pelos contributos de outros cantores provenientes de diferentes registos musicais. Um bom momento da família da música portuguesa.