Sete longos anos, ou um pouco mais que isso, separam o concerto de despedida dos Men Eater, no Stairway Club, em Cascais, e o espetáculo de apresentação do disco homónimo da banda, no Lux Frágil, em Lisboa, que decorreu no passado dia 25 de Janeiro.
Um hiato que demorou demasiado tempo e que conheceu um ponto final à beira-Tejo, o rio que testemunhou muitos dos momentos marcantes vividos pela formação lisboeta, incluindo a abertura do concerto dos germânicos The Ocean, no antigo Lotus Bar, em Cascais, ou a partilha de palco com Metallica e Mastodon, na edição de 2007 do Super Bock Super Rock, junto à foz do Trancão, em Lisboa.
Cascais. Lisboa. Tejo. Denominadores comuns, que nos conduziriam à noite da última quinta-feira.
Apesar da separação, os elementos de Men Eater nunca perderam o contacto e a amizade que os unia, algo que, de forma natural, acabaria por desaguar num novo álbum, doze anos depois de ‘Gold’. O lockdown serviu de catalisador e a celebração dos 15 anos de ‘Hellstone’, o primeiro longa-duração da sua carreira, foi o pretexto ideal.
Em boa hora, Mike Ghost, Carlos BB, Pedro “Gaza” e Carlos Azeitona decidiram voltar a fazer música, em conjunto. A eles, já em estúdio, juntar-se-ia André Hencleeday, trazendo novas ideias e contribuindo para uma renovada energia. O cocktail perfeito para que este disco soasse a novo, sem perder as referências do passado.
Voltando à noite de 25 de Janeiro, as portas do Lux Frágilabriram às 22h00 e os primeiros acordes estavam marcados para as 22h30, porém, a essa hora, ainda era grande a fila que se fazia à porta de uma sala habituada a outro tipo de sonoridades, fazendo prever que muitos eram aqueles que queriam matar a Saudade.
‘Multitude’, primeiro single deste novo registo, foi a música que abriu o espetáculo.
Para quem ainda não tivesse ouvido a obra forjada nos BlackSheep Studios, estava dado o mote para o que se seguiria: o mais recente trabalho dos Men Eater transpira as influências de sempre (Sludge, Stoner e Doom, com algumas pinceladas de Punk e Post-Hardcore), sendo menos acelerado que os seus antecessores. Mais maduro e mais Post. Resultado, quiçá, da idade e das vivências dos anos de ausência.
Seguir-se-ia a primeira incursão pelo passado, através de ‘First Season’ (tema do Vendaval, de 2009), antes que nos voltássemos a concentrar no homónimo Men Eater, com ‘Hermit’ e ‘Worshipers’.
Por esta altura, Mike Ghost perguntava quantos dos presentes estariam a ver Men Eater pela primeira vez. Poucos se manifestaram: a esmagadora maioria do público fora induzida pela nostalgia, ainda que houvesse uma nova geração de fãs e curiosos que, certamente, crescerá, ainda mais, depois desta experiência.
Entretanto, nova viagem no tempo, desta vez até 2007, altura em que saiu o fantástico Hellstone. ‘Black’ foi a malha que se fez ouvir.
Mais ou menos a meio do espetáculo, entrada em cena dos primeiros convidados da noite: Frankie Chavez e a sua lap steel guitar. ‘Grail’ é o tema de abertura de ‘Men Eater’ e traz-nos algumas texturas mais viradas para o Blues e o Folk. Momento refrescante e a prova de que é possível fundir diferentes estilos e influências musicais, de forma orgânica, numa alquimia perfeita.
Depois, ‘Uma Multidão de Pecados’. Infelizmente, André Henriques, vocalista e guitarrista de Linda Martini, não pôde estar presente e interpretar a letra que escreveu. Mike Ghost disse não ser o André, mas que tentaria, dentro do possível, dar voz ao tema e fazer jus àquela que será uma das músicas mais profundas do álbum. Fê-lo com mestria.
Na sequência, ‘Fools’ e ‘Remnant’, sendo que esta última contou com a cantora Sara Badalo, ela que passou pelos The Gravediggers, banda que acompanha o projeto Sam Alone, de Poli Correia (irmão de Mike Ghost). ‘Remnant’ configurou, inclusive, outro dos momentos mais intensos da noite, graças à voz de Sara e à forma como esta se sobrepôs, de forma subtil (mas imperativa), ao peso que emanava dos instrumentos.
Na reta final, ‘Heartbeating Locomotiva’ (Vendaval, 2009) e a muito aclamada ‘Lisboa’ (Hellstone, 2007), outro tema cuja letra saiu da mente criativa de André Henriques e, provavelmente, a música mais aguardada da noite.
O epílogo chegou com ‘Mortice’. Cedo de mais, porém: oito anos de fome, ou quase isso, não se matam de uma hora para outra…
Terminadas as hostilidades, ficou a certeza de que a banda regressou para ficar, mais forte e coesa que nunca, e que “uma multidão de pecados” saiu do Lux Frágil, junto ao Tejo, com vontade de ouvir mais, deste novo capítulo de Men Eater.
Foto: ©Ana Viotti