Nouvelle Vague – Uma Viagem Pela História Do Post-Punk No Lisboa Ao Vivo

Reportagem de João Barroso (texto) e Diana Silva (fotografia)

Nouvelle Vague

Duas décadas depois do lançamento do seu registo de estreia, o homónimo Nouvelle Vague, o conjunto parisiense decidiu embarcar numa tour de celebração do disco, digressão essa que inclui passagem por Portugal, de norte a sul, incluindo os Açores.

Fundado em 2003, por Marc Collin e pelo malogrado Olivier Libaux, o conjunto francês pretende fazer um tributo às canções da era Post-Punk, reinventando vários clássicos do género e temperando-os com o perfume da Bossa Nova. Este espetáculo conduz-nos através das estradas britânicas outrora palmilhadas por bandas como Joy DivisionThe Clash ou The Sisters of Mercy, oferecendo-nos, também, uma pequena incursão pelo norte do continente americano, região que viu nascer Dead Kennedys ou The Cramps, por exemplo.

Antes, porém, tivemos oportunidade de ouvir o projeto a solo de Nadéah Miranda, uma das muitas cantoras que, ao longo dos anos, emprestou a sua voz à Nouvelle Vague.

Nadéah

À hora marcada, a australiana Nadéah sobe ao palco, apresenta-se e confessa estar nervosa. Tenta comunicar em português, denunciando as suas raízes: apesar de ter nascido na Land Down Under, a família materna tem origens diversas, incluindo Portugal. “Tudo bem, meus queridos?”, cumprimenta, antes de interpretar “Lego Hair“, a primeira música que se faz ouvir, no Lisboa ao Vivo.

“Obrigada, Lisboa! A próxima canção chama-se “A Perfect Place to Die“, ou, em português, “Um Lugar Perfeito para Morrer”.”, anuncia. Segue-se “Stuck on the Rhythm“, que fala sobre “relações repetitivas”, e a revelação de que lançará dois álbuns, em 2025. Depois, “Où es-tu?” e “Inbox”, momento em que aproveita para refletir: “There are two types of people! Those who clean their mail inbox and those, like me, who have a full mail inbox!”, graceja.

 

“Esta última canção…it’s about mulheres! Women…suicidas!”. Nadéah continua a tentar expressar-se na língua de Camões, algo que é muito bem recebido pelo público, que, por esta altura, já se deixou conquistar pela australiana.

At the Moment” é a última música que canta, com o apoio vocal da audiência, antes de se despedir e convidar a plateia a “dizer olá e comprar um vinil”. Por fim, despede-se, embora regressasse mais tarde, para se juntar à Nouvelle Vague.

“Merci e obrigada, meus queridos! Have a wonderful night with Nouvelle Vague!”.

Nouvelle Vague

A viagem por terras britânicas começa nos arredores de Manchester, em 1980, ano em que os Joy Division gravaram o clássico “Love Will Tear Us Apart“. É Mélanie Pain quem interpreta um dos mais célebres temas forjados pela mente criativa de Ian Curtis, sendo, igualmente, a francesa a dar início à canção seguinte – “People Are People“, de Depeche Mode – momento em que entra em cena a australiana Phoebe Killdeer, sob uma grande ovação.

“Bonsoir, Lisbonne!”, cumprimenta-nos Mélanie, antes que soem as primeiras notas de “Only You“, dos Yazoo, banda umbilicalmente ligada à anterior, através do teclista e compositor Vince Clarke. “Merci!”, escutamos, no final. Seguem-se “Making Plans for Nigel“, de XTC, e “This is Not a Love Song“, de Public Image, música em que surge Alonya, a última das vocalistas a subir ao palco do Lisboa ao Vivo. “It’s a little cold in here, isn’t it? How about warming things up?”, sugere a cantora, entregando-se, de seguida e na companhia do contrabaixista François Poitou, a uma extraordinária versão de “Girls on Film“, de Duran Duran.

Entretanto, Mélanie volta a dirigir-se ao público, perguntando se pode falar em francês. Perante a concordância da sala, conta-nos, na sua língua nativa, que já passou por Albufeira e pela Figueira da Foz e que, agora em Lisboa, procura “o homem português perfeito”. Depois, olhando para um dos espectadores, diz “this is for you!” e canta(-lhe) “What I Like Most About You is Your Girlfriend“, dos The Specials, conjunto originário de Coventry.

Rumamos a sul, até Crawley, pequena cidade nas imediações do aeroporto de Gatwick, para escutar “A Forest“, de The Cure, e voltamos a norte, sem precisar de avião. Estamos em Leeds, localidade que viu nascer The Sisters of Mercy, responsáveis pela composição de “Marian“. Aos primeiros acordes, os aplausos são instantâneos, mostrando que este é um dos temas preferidos da plateia, à luz desta nova vaga sonora.

Durante “Teenage Kicks“, de The UndertonesMélanie Pain comporta-se como uma maestrina, conduzindo a interpretação do público, que deve representar as diferentes emoções de um teenager. “Merci beaucoup!”, agradece a artista. É hora de “Should I Stay or Should I Go“, obra eternizada pelos The Clash, merecedora de enorme ovação e durante a qual Alonya desce do palco e abraça a audiência. “Tchau!”, despede-se, no final, dando lugar a Mélanie e Phoebe, que interpretam “Just Can’t Get Enough“, mais uma incursão pela discografia de Depeche Mode, sendo que, durante a canção, Lisboa é presenteada com um fantástico solo de percussão de Julien Boyé.

Este é quase um espectáculo à parte, oferecido pelo baterista: enquanto toca, canta e vai pedindo o auxílio da plateia. “Lisboa, como é?”, pergunta Boyé, em bom portugês. A sala baila, ao ritmo dos pratos, timbales e tambores, batendo palmas a compasso. No final, a merecida aclamação.

A próxima paragem é num ambiente gótico, em Northampton, para ouvir “She’s in Parties“, de Bauhaus. É Phoebe Killdeer quem nos conduz por estes caminhos mais sombrios e melancólicos. “Muito obrigada! I’m so happy to be here!”, confessa, antes de convidar Nadéah a subir ao palco, para cantar “The Guns of Brixton“, mais uma dos The Clash, que, tal como Depeche Mode, surgiram em dose dupla, ao longo da jornada.

A viagem é longa, mas não é feita de carro. O veículo utilizado é a nossa imaginação, conduzida pelas vozes e timbres que emanam do palco. Sendo assim, estamos autorizados a beber. “Santé!”, brinda Phoebe, com um copo de vinho branco. Depois, atravessamos o Atlântico e ficamos com uma versão de “Too Drunk to Fuck“, dos norte-americanos Dead Kennedys, enquanto Alonya e Nadéah vão servindo alguns dos presentes, com uma dose do néctar de Baco. Sem que disso tivéssemos dado conta, o Lisboa ao Vivo é, agora, uma enorme discoteca. Dança-se, sem que se dê importância aos quilómetros já percorridos e ignorando o cansaço, mas os corpos são humanos e precisam de um bálsamo. Talvez por isso, regressamos à Grã-Bretanha e estacionamos em Bath, para escutar “Shout“, de Tears for Fears.

Grita-se a plenos pulmões. Canta-se a uma só voz.

Nova incursão por Coventry, na companhia de “Friday Night, Saturday Morning“, música de The Specials, e passagem por Colchester, para ouvir “I Melt with You“, de Modern English, canção aproveitada para as despedidas e apresentação de cada um dos músicos em palco: Mélanie PainPhoebe Killdeer e Alonya, nas voz, François Poitou, no contrabaixo, Julien Boyé, na percussão, Nico Fau, na guitarra, e, claro, Marc Collin, nas teclas.

O combustível está no final, mas ainda faltam percorrer algumas milhas, pelo que, depois de recarregar baterias, o colectivo regressa à nossa companhia e interpreta “This Charming Man“, de The Smiths, e “Human Fly“, dos The Cramps, o que obriga a uma segunda visita aos Estados Unidos, país de onde não voltaremos a sair.

“Would you like one more?”, pergunta Mélanie. “This will be the last, last, laaaast song. Thank you so much for coming out, tonight!”.

E ficamos com “In a Manner of Speaking“, de Tuxedomoon, música dedicada a Marc Collin e ao malogrado Olivier Libaux, fundadores da Nouvelle Vague e responsáveis por esta (nova) vaga musical que navegámos, ao longo da noite.

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