Os góticos eram uma das tribos urbanas mais populares, durante os anos oitenta. Os The Mission, uma das maiores referências deste estilo musical, atuaram esta quinta feira no LAV – Lisboa ao Vivo.
A banda inglesa, formada em 1986, é liderada por Wayne Hussey e Craig Adams, dissidentes de outro registo lendário do gótico: The Sisters of Mercy.
Mantém na estrada a A Deja Vu Tour, uma série de concertos de celebração dos seus 30 anos de carreira. A digressão já passou por várias cidades da Europa, incluindo Londres, Paris, Berlim e Madrid. Encontra-se também documentada num duplo álbum, gravado em Shepard’s Bush Empire.
A tribo voltou a reunir-se esta quinta-feira em Lisboa. Os The Mission optam atualmente por pequenas salas, onde conseguem aconchegar os seguidores. Um alinhamento de grandes êxitos assegura noites inesquecíveis, em que o público é agarrado logo no primeiro tema e segue viagem pela estrada da melancolia, com grande emoção.
Uma intro musical destacou o logo Celta, iluminado no fundo do palco, antes da banda entrar em palco. Wayne Hussey assumiu a sua posição ao centro e da sua guitarra branca fez soar aqueles acordes característicos, uma espécie de assinatura da sonoridade da banda, que fez furor no final dos anos 80. Abriram a noite com “Beyond the Pale” e o público seguiu-os, com devoção. O refrão estava bem presente na memória e os braços no ar ondularam com a música.
Em palco acompanharam Wayne Hussey o guitarrista Simon Hinkler, o baixista Craig Adams e o baterista Mick Brown.
Os góticos surgiram como uma subcultura no final dos anos 70 e início dos anos 80, em Inglaterra. Caracterizados por um estilo sombrio e melancólico, eram frequentemente associados à música post-punk e new wave, como Bauhaus, Joy Division e Siouxsie and the Banshees. Foram estes os nomes que voltámos a ver circular em algumas das t-shirts, nesta noite de 2023. E muitos foram os que passaram antes pela mesa do merchandising, estrategicamente colocada à entrada, para atualizar o look com a t-shirt da digressão.
A sala estava muito composta, com a varanda do piso de cima aberta e repleta de gente – da era do isqueiro no ar, agora substituído pelo telemóvel.
A noite contou com um alinhamento composto de clássicos da banda, incluindo “Stay With Me”, “Like a Child Again” e mais tarde “Butterfly on a Wheel”, “Wasteland”, e “Deliverence”.
Assistimos, na última década, a alguns concertos Wayne Hussey a solo que foram uma espécie de “discos pedidos”. Pelo seu à vontade e desejo de interação como o público, continua a perguntar “O que é que querem ouvir?”. Não foi por isso de estranhar que o víssemos a aceitar a caneta e o disco de um admirador e deixar um autógrafo, a partir do palco. Ou a pegar o telemóvel de uma admiradora que pedia uma “selfie”.
A sua postura em palco é a de quem vive a música com gosto e cultiva a proximidade com quem está presente. Inúmeras vezes deixou a guitarra pendurada, apoiada no corpo e abriu os braços em direção à assistência, a sublinhar algumas frases do que cantava. Muitas vezes afastou-se do microfone – nos momentos mais populares – e coube ao público o prazer de completar os refrões.
Sentiu-se uma troca de energia no recinto e uma alegria que acabou por ser o oposto da estética negra que caracterizou o movimento que os catalogou. Também o público já cresceu e ultrapassou a atração por temas como morte, solidão e alienação. Ficou a sonoridade e essa é para celebrar sempre.
“Deliverance” é o tema com que habitualmente se despedem e vão saindo do palco, um a um, enquanto o público se mantém em loop a cantar “Give me, give me, give me, deliverance / Brother, sister, give me, give me / Deliverance, deliver me”.
Ao regressar ao palco, Wayne Hussey trouxe uma história de amor. Entregaram-lhe uma carta de um casal que está a celebrar 30 anos de namoro e 25 de casamento. Dedicou-lhes “Bird Of Passage” a música deles e ficamos todos derretidos com este momento extra e “fofinho”. Neste encore coube ainda “Kingdom Come”, “Severina” e “The Crystal Ocean”.
“Tower of Strength” fechou a noite e as memórias dos dias sombrios longínquos voltaram a ser guardadas, até uma próxima visita. The Mission provaram, mais uma vez, que são uma das bandas mais influentes do gótico rock.
Phantom Vision
A primeira parte do concerto foi assegurada pelos Phantom Vision, a banda lisboeta liderada por Pedro Morcego. Alinham-se no estilo rock gótico darkwave, com forte influência punk.
Trouxeram um espetáculo com alguns momentos surpreendentes, ao incluir uma bailarina em alguns dos temas. Foi pin up em “Strange Attraction”, proporcionou um bom momento visual ao dançar com asas em “Total Eclipse” e entrou vestida de capuchino vermelho – mais próximo do pecado do que da inocência – em “One Dollar”. Deixaram um agradecimento, no final, e a vontade expressa de passar, também eles, para o outro lado sala e assistir ao concerto dos The Mission.