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Pedro Abrunhosa – O Porto É A Sua Casa

Reportagem de Rosa Margarida e Paulo Soares

Espiritual iluminou ontem, dia 15 de novembro, o Coliseu do Porto. Pedro Abrunhosa e os Comité Caviar foram às «funduras do mundo» e recuperaram as palavras de oito discos de originais. Uma sala completamente esgotada, uma música reinventada, um caminho, uma viagem, «Uma noite encantada / Para o resto da vida».

Foi precisamente com “Momento” que Pedro Abrunhosa subiu ao palco, ovacionado por um público ávido de música e de luz. O cantautor entra sozinho e ao piano reinterpreta versões de temas que a sala sabe de cor: “Eu Não Sei Quem Te Perdeu” e “Deixas Em Mim Tanto De Ti”.

Pedro Abrunhosa ocupa o centro do palco, quando na verdade a sala já lhe pertence, e “Será”, o tema que se segue, com os versos exibidos na tela gigante: «Será que sentes esta mão que te agarra / Que te prende com a força do mar contra a barra / Será que consegues ouvir-me dizer / Que te Amo tanto quanto outro dia qualquer». Um público rendido à «construção literária» de um dos grandes compositores contemporâneos.

Seguem-se “Eu, Gisberta” e “O Senhor do Adeus”, temas-homenagem – um olhar para dentro de nós, temas que afastam a efemeridade da música, palavras que cunham a existência dos que foram (e ainda são) e, nas palavras de Pedro Abrunhosa, «um silêncio reverberante e uma festa sempre pronta a eclodir». Que noite mágica se construía ao redor das palavras, dos silêncios, das pessoas!

“Vamos levantar voo” de Espiritual faz subir a tela e revela os Comité Caviar. O mote que faltava – se ainda havia algo em falta – estava dado. Pedro Abrunhosa, em forma de aviso, diz-nos que a sua música «Não é para entreter, mas para sentir»…talvez seja veleidade contrariá-lo, mas a noite que se escreveu no Coliseu foi…. Assim, simplesmente, sem adjetivos (ainda que “inefável” talvez lhe fizesse jus…talvez).

Do seu álbum Luz, “Quem me Leva os Meus Fantasmas”, para voltar ao seu último trabalho, com “Se Tens de Partir Não Me Contes”, gravado com Lucinda Williams (que a ausência nesta noite não extinguiu os versos mentalmente segredados «Hold me, Hold me, / Stars are shining through, / Hold me, Hold me, / I’m lost in love for you») e “Amor Em Tempo De Muros”, aos migrantes, emigrantes, imigrantes, que as vozes de Pedro Abrunhosa e Lila Downs, perpetuaram no álbum.

Na senda das homenagens (ou imortalizações!), um dos (muitos) momentos da noite: ao Amor! Aos pais de Pedro Abrunhosa, à mãe que faleceu recentemente e ao pai de 95 anos, aos que «provaram que o amor é possível» e a quem o cantor, antevendo o momento da inevitável separação, escreveu e dedicou “Pode Acontecer”, com uma foto do casal na tela e o sabor de uma lágrimas nos lábios ao som de:

Amanhã,
Haja o que houver,
Pode acontecer
Eu ficar p’ra trás.
Amanhã,
Vais prometer,
Pode acontecer
E vais ser capaz.

Seguiram-se “Fazer o Que Ainda Não foi Feito”, do álbum homónimo de 2010 e, de volta a 2018, o tema “Vem Ter Comigo Aos Aliados” porque «Aqui começa a Terra prometida», para regressar no Tempo, lançado em 1996, com o intemporal “Se Eu Fosse Um dia o Teu Olhar” e, numa viagem, sem tempo nem espaço, de novo ao piano, “Não Desistas de Mim”. É, aliás, Viagens, álbum de 1994, que entra num alinhamento perfeito com uma sala, ao rubro a entoar o tema “Não Posso Mais”. O remate perfeito para o “Rei do Bairro Alto”!
Como não entrar em Contramão (2013)? A versão simplesmente arrepiante de “Para os Braços da Minha Mãe”.

A noite passa por temas reinventados como “É Preciso Ter Calma” e “Socorro”. Quase três horas de um espetáculo sem tempo. Uma ímpar consagração de um cantor único. As lanternas dos telemóveis num espetáculo de Luz (2007) e «Enquanto não há amanhã / Ilumina-me, Ilumina-me».

No encore, Pedro Abrunhosa “passeou” pelo corredor central guiado pela “Lua” – Como são «loucas as noites» que passamos sem dormir!

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A primeira parte do espetáculo esteve a cargo de Paulo Praça, que cativou a sala com temas como “Arquitetura da Ecologia” e “Linhagem Nenhuma”, poemas de Valter Hugo Mãe; “Sabes Mãe”, do seu mais recente álbum; o fado reinventado em Amália Hoje, “Gaivota” e a terminar “A mesma canção”. Quatro músicos em palco, sem cenários elaborados ou iluminação neotech, a mostrar que a boa música resulta por si só.

Uma palavra final – porque foram as palavras (mesmo as mais veladas ou silenciosas) que conduziram uma noite magnífica – para Pedro Abrunhosa, que se inventa, reinventa e se escreve ao longo dos anos. Com receio de não ter a palavra certa, transcrevo os versos de Pedro Abrunhosa:

Para onde olhares, eu corro,
Se me faltares, eu morro,
Quando vieres, distante,
Solto as amarras
E tocam guitarras
Por ti como dantes

“Parte de Mim”, Tempo, 1996.

Pedro Abrunhosa e os Comité Caviar voltam hoje a pisar o palco do Coliseu Porto, para mais um espetáculo esgotado e uma noite, que se prevê, mágica

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