Crónica: Cultura Para Todos

Nº 42: Para Que Serve Ver Um Filme Numa Sala De Cinema?

Este tema pretende funcionar como um alerta e também como uma tomada de posição perante uma das consequências mais nefastas da pandemia: a sobrevivências das cadeias de salas de cinema de menor dimensão. Sim, eu sei que o mesmo se aplica a todos os ramos das artes e da cultura, mas, para mim ver um filme numa sala escura bate todos os outros prazeres culturais. Não é só o ato em si do visionamento coletivo que permite valorizar ou desprezar um filme, mas é um conjunto de ações que praticamos antes, durante e após uma ida a uma sala de cinema que lhe traz maior impacto do que ver o mesmo filme na nossa sala. 

Pois, eu sei que nos últimos dez anos o talento criativo e o gosto pelo risco fugiu das produtoras e estúdios de cinma para as plataformas de streaming, que, não apostaram apenas na produção e programação de filmes e séries norte-americanos mas alargaram a sua abrangência a um universo  cada vez mais global. Os filmes americanos, que ainda são os mais vistos, estão cada vez mais vocacionados para o público adolescente. As histórias adultas, com atores de reconhecido talento, quase que desapareceram ou são produzidos pelas Netflix e HBO que por aí andam. Resultado: há semanas seguidas com poucos ou nenhuns títulos que nos motivem para uma ida à sala escura. 

É o efeito pescadinha de rabo na boca: o maior investimento em guionistas e atores faz com que estes transitem do meio “cinema” para a televisão levando maior originalidade às produções do streaming. A ida ao cinema deixou de ser “aquele programa” para o convívio social, porque o público-alvo já não é adulto, são crianças e jovens, o que se reflete nos títulos disponíveis. Para dificultar todo este cenário complexo, o confinamento durante o estado de emergência reforçou este hábito de ficar por casa a consumir ficção e documentários para passar o tempo ou evadir da estranha realidade em que nos encontramos. 

Ver um filme banalizou-se. 

Atenção, não sou fundamentalista, também gosto de os ver em casa, mas, desenganem-se, as produções cinematográficas visionados desta forma não ficam memorizados da mesma forma. Há todo um ritual na ida a uma sala: a deslocação de ida e volta para casa, as pessoas com quem vamos, se está muita ou pouca gente, os cartazes e os trailers que descobrimos.

Por Óscar Enrech Casaleiro – Comunicador cultural desde 1997, atento à atualidade desde sempre.

N.R.: Esta crónica tem periodicidade quinzenal e é da inteira responsabilidade do seu autor

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