Ofertório – Uma Celebração Em Família

Reportagem de Rosa Margarida (Texto) e Paulo Soares (Fotos)

Caetano, Moreno, Zeca e Tom Veloso voltaram a Portugal, um ano depois de terem esgotado três espetáculos. O Coliseu do Porto Ageas recebeu, ontem, os músicos com a leveza e intimidade que cunha um espetáculo em família. O português carregado do Norte, o sotaque descontraído do Brasil, as vozes únicas, os acordes de um violão, os pés descalços definem, sob um cenário minimalista, um “Ofertório” que se estende para lá de um serão, que galga rios e mares, que junta continentes.

A nostalgia de “Baby” e a liberdade de “O seu Amor”, os dois primeiros temas da noite, recordam Gal Costa e Gilberto Gil, num prenúncio de celebração, um ode à música – e aos músicos – brasileira; segue-se “Boas Vindas”, escrito quando Zeca nasceu, o tema serve agora para acolher o público e agradecer, nas palavras do patriarca, “a felicidade de voltar ao Porto”.

Seguem-se, no alinhamento temas como “Todo Homem”, de Zeca Veloso, com a melancolia e o piano em pano de fundo; o samba em dia de chuva de “Um passo à frente”; “O Clarão” do “caçula” Tom, que de acordo com Caetano “não gosta de cantar”, mas presenteia o público com uns passos de samba.

De Moreno Veloso, o mais prolífero na música, dos irmãos, temas como “De Tentar Voltar”; “Um Canto de Afoxé”, que escreveu quando tinha 9 anos e “How Beautiful Could a Being Be”. Nota ainda para “A Deusa do Amor”, cantado já quase no fim do espetáculo. É o filho mais velho que presenteia o pai, “nada melhor do que fazer um pai feliz” e o público com a interpretação de “Leãozinho”.

Antes desse momento único, passam pelo palco temas como o samba baiano “A Tua Presença morena”; o clássico “Trem das Cores”, ao som do papel de lixa; o funk “Alexandrino” e a intemporal “Oração ao Tempo” e, o público, rendido, acredita ‘Ser possível reunirmo-nos (…) Num outro nível de vínculo”.

Ao arrepiante tema “Alguém cantando” numa singular interpretação de Zeca, com um final a cappella de pai e filho, a religiosidade e a multidiversidade no centro do palco: ateísmo, cristianismo e macumba “entrelaçam-se” e lembram um valor maior – a família. “

Ofertório”, nome do show e título do tema, foi escrito por Caetano por ocasião do 90º aniversário da mãe e é, nas palavras do próprio “uma homenagem não só à minha mãe mas também à religiosidade dos meus filhos”.

O espetáculo é marcado por homenagens várias e celebrações de vida (e de família) em temas como “Ela e Eu” e “Não Me Arrependo”, escritos para as mães dos filhos de Caetano e “Reconvexo”, tema de Caetano para a sua irmã Maria Bethânia.

“Ofertório” é um espetáculo intimista, bastando-se das vozes únicas do clã Veloso; da guitarra, do violão e do, ocasional, piano; do prato, do garfo e do papel de lixa, usados por Moreno como instrumentos musicais; do cenário minimalista assinado por Hélio Eichbauer .
Permito-me abrir um pequeno (grande) parêntesis para relembrar o cenógrafo, falecido em julho de 2018. As quatro cordas, do cenário de Eichbauer, numa clara evocação aos três filhos e ao pai, numa alusão ao cordão umbilical, aliadas ao sol, ao eclipse, ao centro representam, de uma forma simples, a união familiar, através do amor e da música.
À ovação, de pé depois da saída de palco do quatro músicos, um “encore” pautado pelo tema “Tá Escrito”, sublinhado em cada verso:

Erga essa cabeça, mete o pé e vai na fé
Mande essa tristeza embora
Basta acreditar que um novo dia vai raiar
Sua hora vai chegar”

por esta demanda universal de “seguir em frente”.

As palmas retumbam no Coliseu do Porto Ageas, o público aplaude de pé a família Veloso, que volta, para o tema que encerra o espetáculo, “A Luz de Tieta”.

A música está no ADN Veloso e o espetáculo sublinha a magnífica herança musical que se perpétua.

Ofertório segue para o Centro de Artes e Espetáculos na Figueira da Foz, no dia 3; o Coliseu de Lisboa, no dia 5; o Teatro Micaelense, nos dias 7 e 8 e termina o seu périplo por Portugal, no dia 10 de julho, no Teatro das Figuras, em Faro.

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