Vodafone Mexefest 2014: Um Fim-de-Semana Bem Mexido

Reportagem de Mariana Ferreira Machado (texto) e Luciana Letras (fotos)

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Este fim-de-semana, nem o frio nem a ameaça de chuva impediram que o coração de Lisboa se enchesse de gente com sede de dançar e ouvir música.

Dezenas de músicos atuaram numa dúzia de espaços, entre a avenida da liberdade, o rossio e os restauradores, todos eles icónicos símbolos  locais de passagem da cidade. Com o mapa de papel na mão, quais descobridores de canções perdidas, ou orientados pelo mapa e informações da app mobile do Mexefest, os festivaleiros andaram em busca da melhor música. Sim, porque este ano houve muita coisa por descobrir: concertos surpresa, de estilo intimista, cuja hora e local só se desvendavam para os curiosos que olhavam atentamente os mupis e descodificavam as mensagens com os óculos de filtro vermelho, distribuídos pela Vodafone.

Dia 28, ao entardecer, entre os petiscos da Casa do Alentejo, local de passagem dos artistas do Mexefest, as imperiais no Ateneu, e o tradicional chocolate quente oferecido nas ruas, a romaria começou ali bem perto, na Igreja de São Luís dos Franceses, para ouvir os doces cânticos de JJ. A sala estava completamente preenchida por um público que “sabia a missa de cor”, acompanhando a banda sueca nos seus temas mais conhecidos, como é o caso de “All New Everything” e “African from Malaga”. A banda, composta por um guitarrista que também é bailarino, um Dj a tomar conta da  mesa de mistura no altar e a voz angelical de Elin Kastlander, soube enquadrar-se no espaço onde tocavam, trazendo-lhe o romantismo e mistério necessários para um bom começo de noite.

Enquanto isto, Capicua encheu a sala do São Jorge com o seu rap de “Sereia Louca” que dá a volta a cabeça dos seus inúmeros fãs, e a girls band espanhola do momento, de rock frenético e espontâneo, Deers, agitaram a garagem da Epal, dando-se a conhecer a um público à descoberta.

Às dez da noite chegam os primeiros cabeças de cartaz do primeiro dia de Mexefest: tUnE-yArDs  inauguraram o Coliseu dos Recreios com o tema “Stop That Man” e deixaram logo bem claro que os ritmos africanos iriam dominar as sonoridades. Em palco havia cinco músicos, com a excêntrica Merrill Garbus no centro, dona de uma voz vibrante e versátil.  A banda norte americana fez do coliseu um espetáculo de cor, purpurinas e muita diversão ao som do seu pop festivo.

Surge então o primeiro dilema da noite e a vontade de ser omnipresente: ver Kindness ou a cantautora britânica Shura? Com o coração dividido, optámos por Kindness e fomos então esperá-lo à estação ferroviária do Rossio às 23h20 em ponto! A abrir o concerto, Adam Bainbridge, vestido de negro e colarinhos brancos, cantou uma cover de Whitney Houston, “I Wanna Dance With Somebody”. E a partir daí, toda a gente dançou com toda a gente. Funk, house, R&B e soul são os ingredientes de Kindness que contagiaram o seu público dançarino com boa disposição.

Esta boa disposição levou-nos à última paragem da noite, novamente o Coliseu, para ver Anne Erin Clark, ou melhor, St. Vincent.

Já nos havíamos encontrado com ela há dois anos atrás, no Meco, e por isso as expectativas estavam altas. E foram cumpridas, como seria de esperar. O concerto mais aguardado da noite, foi amado por uns que a aplaudiam e acompanhavam sem falhar uma sílaba, e odiado por outros que saíam a meio do espectáculo.

Entre temas como “Digital Witness”, “Cruel”, “Regret” e “I Prefer your Love”, St. Vincent rendeu-se ao braços dos fãs onde nadou e ao chão do palco onde se estendeu enquanto cantava iluminada pela pirotecnia das luzes. E é desta forma esquizofrénica, com uma teatralidade encantadora e desconcertante, que Annie Clark nos ensina a interpretar a música e o rock – efusivamente, freneticamente – com a alma entregue à guitarra e o coração entregue ao público.

A fechar a noite, estiveram ao comando dos discos duas raposas do afro-house e do kuduro, os DJ’s Marfox e Nigga Fox, que deram música aos mais resistentes até às 4 da manhã.

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Dia 29, depois de um solarengo dia de Sábado nada melhor que mais música nova para terminar bem a noite.

Após ouvirmos Pedro Lucas no Starbucks do Rossio a apresentar o seu álbum mais recente, Águas Livres, ficámos ali perto, ansiando por ouvir a banda de Curtis Harding. Esperávamos apenas sonoridades do soul e blues que o caracterizam mas surpreendeu-nos com laivos de rock do seu único, mas admirável álbum “Soul Power”. Este poder e energia foi levado a cabo do início ao fim do concerto, onde para além de temas como “Cast Away” ou “Drive my Car” ainda tivemos direito à versão de “Ain’t no Sunshine when she’s gone” de Bill Withers.

Seguimos para Sharon Van Etten, que sob a luz azulada que a iluminava, logo arrepiou o Coliseu com “Afraid of Nothing”, o tema de abertura do seu álbum Are We There. Mais canções lentas e melódicas se seguiram e conquistaram o coração do fãs. Enquanto conversava com o público que lhe respondia calorosamente, afirmou ser uma “rapariga de sorte” ao apresentar a sua talentosa banda. Vestida de vermelho e com o seu ar dócil, a condizer com a voz, despediu-se do público com “Every time the sun comes up”, deixando memórias de um concerto muito bonito.

Ainda a noite ia a meio, as nuvens carregadas choraram leves chuviscos que não assustaram nem por pouco os “Mexefestianos”, e muito menos os Cloud Nothings. O Ateneu Comercial, foi por momentos, virado do avesso com este trio de punkers, espalharam o rock mais pesado na velha sala do ateneu, com direito até a mosh pits e crowdsurfing.

Foi uma banda sonora adequada aos saltitos em que o meu coração estava para ver Perfume Genious. Faltava ainda um quarto de hora para o inicio do concerto, já a entrada do São Jorge se apinhava de fãs incondicionais, como eu, para ver Mike Hadreas e os seus companheiros.

Uma sala com lotação esgotada adivinhou-se sem espaço para mais gente, e assim que a banda pisou o palco encheu-se ainda mais. O silêncio dos espectadores ouviu-se para deixar gritar as melancólicas e redentoras baladas como “Take me Home” e “Dark Parks”. O vocalista de lábios e unhas pintadas de encarnado vivo, sem medos de se libertar nem afirmar a sua sexualidade, mexeu o corpo, o piano, a voz (com gritos estridentes de sofrimento e libertação) e mexeu também as emoções de quem estava ali só para o ver. Altos e baixos de histerismo fizeram o deleite deste concerto tão aguardado. Para o final,  cantou “Queen”, o grande single do novo disco, a ser celebrado com a energia que pede, e a terminar o concerto com a intensidade que vinha aumentando desde o início.

Depois de uma dose tão grande de emoção, pouca coisa nos podiam surpreender, mas Wild Beasts não desiludiram. Mais uma vez o Coliseu se apinhou de gente para o grande concerto de despedida do festival.  Numa hora e meia, os Wild Beasts atravessaram a discografia entre canções que fazem dançar a contemplação numa batida coesa. Temas como “Sweet Spot”, “Daughters”, “Hooting & Howling”, ou o single “Wanderlust” a fazer soltar estados de espírito em formato de dança, foram alguns dos temas mais celebrados num concerto em que a celebração e os elogios a Portugal foram constantes. Despediram-se com um brinde, e com uma luz sóbria e uma salva de palmas de um desejo de regresso.

2014 foi mais um ano em que o Vodafone Mexefest nos trouxe nomes inconformáveis do melhor da música alternativa, com uma organização irrepreensível, diversidade musical, salas cheias e certamente um público cada vez mais fiel. Esperemos que para o ano haja mais.!

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